PENSANDO OU OUVINDO
Entre as descobertas
proporcionadas pelo isolamento encontra-se a constatação de que sobrevivemos
sem o Jornal Nacional. Ele não é totalmente abominável, pelo contrário, a
questão é que quando começa, às 20h30min, os outros noticiosos já mostraram
todos os acontecimentos importantes do dia. Além disso, sofre a concorrência
dos canais a cabo, como a Globo News e a CNN, em tudo igual à primeira, já que
muitos dos seus comentaristas, editores e apresentadores são oriundos da
Globo.
A CNN conseguiu enganar o
Governo, convencendo Regina Duarte a falar com exclusividade. Os hábeis
entrevistadores deram corda à entrevistada, que foi falando, falando, até
perceber a pergunta-denúncia de Maitê Proença. A vingança, diriam os
bolsonaristas.
Outra descoberta sensacional do
isolamento é que além de não precisar do Jornal Nacional não preciso também da
Folha de S. Paulo nem do Estadão, dos quais sou leitor assíduo há muitos anos. Não
preciso, mas não dispenso. Do segundo, aliás, fui redator, nos tempos em que
substanciosas matérias eram substituídas por versos de Camões.
Ler jornal para quê? Antes do sol
nascer as emissoras de rádio e a internet já dispararam tudo. O Pulo do Gato,
da rádio Bandeirantes, está aí há 60 anos, com o mesmo José Paulo de Andrade,
ora indignado, ora sereno. Não só ele, também os demais radialistas se baseiam nos
jornais ou em suas respectivas agências de notícias. Ai deles não fora a
Agência Folha, a Agência Estado e as agências internacionais. Por outro lado, as
emissoras de TV anteciparam seus jornais, que agora começam a partir de 4 da
madrugada.
Talvez uma das mais importantes
descobertas do isolamento tenha sido a oportunidade de acessar tudo quanto é
pesquisa, com as facilidades da internet. A gente não precisa percorrer os
sombrios corredores da Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro, nem comprar em
suaves prestações a Enciclopédia Universal. Tudo está a um clique. Já ouvi um a
um, por exemplo, todos os concertos para piano e orquestra de Beethoven, que
não consegui ouvir frequentando ao longo de muitos anos o Teatro Santa Isabel
do Recife, o Teatro Municipal e a Sala São Paulo, além de festivais como os de
Campos de Jordão. De tanto ir a concertos, aliás, meu filho virou maestro. Eu o
levava às vezes, à revelia dos zelosos porteiros.
Assim, se amanhã for preciso
entrar na fila da Caixa para pedir o auxílio emergencial, levo celular e fone
de ouvido para curtir Shostakovich, Clovis Pereira ou Choronas.
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