VOLTAS QUE O MUNDO DÁ
Sede do PC francês, foto feita por mim em 1976
Meu ex-cunhado Paulo Siqueira, que mora a poucos
metros da Notre Dame desde que se formou em Medicina há 50 anos, estranha a
falta de solidariedade dos Tiné aos Siqueira, no caso da Catedral. Ele,
certamente, já se sente um francês, casado que é com uma francesa, com filhos e
netos franceses.
Não sei se devo pedir desculpas ou justificar a
indiferença. Inicialmente, devo chamá-lo de privilegiado. Nem Chico Buarque,
tampouco Fernando Henrique Cardoso, que possuem apartamentos em Paris,
desfrutam de tal intimidade com a igreja, pois do reduto jataubense no
Boulevard Saint Michel à Ilha da Cidade basta atravessar uma ponte. Dá pra ir a
pé. Em segundo lugar, não sei se minha cultura made in Caruaru alcança os
valores de tantos objetos milenares ali depositados.
Quando visitei a velha cidade preferi ver Mona Lisa,
no Louvre, ou o que resta dela depois de tanto reparo. Nem fiz “selffie”. Fui
visitar as linhas modernas da sede do Partido Comunista francês, desenhada pelo
brasileiro Niemayer e egoisticamente fui ao Arquivo Nacional tentar descobrir a
origem do sobrenome Tiné. Informaram que vem de Tonel, apelido dado aos homens
que vendiam água em tonéis carregados sobre os ombros, na zona rural. Daí
Tonel, Tonelli, Tinel, Tinelli, Tinet e Tiné, nomes abundantes hoje na lista
telefônica de Paris. Posteriormente, surgiram os Tiné no Nordeste do Brasil.
Mas o que inibiu minha manifestação de solidariedade
não foi nada disso. Talvez tenha sido o impacto das imediatas intervenções,
todo mundo querendo mostrar que já esteve lá e provar, com “selffies”. Preferi
esperar e me divertir com o exibicionismo cultural de certos turistas. Até
recordei que toda vez que fui à Europa caí na mesmice de subir e descer do
ônibus o tempo suficiente para fotografar monumentos e demais pontos turísticos. No interior da capela Sistina a ansiedade era tanta que os guardas nos empurravam para dar lugar a novas multidões.
Nada justifica minha falta de solidariedade, salvo o
fato de andar mais preocupado com as mudanças de outra catástrofe, invisível a
olho nu, que anda ocorrendo por aqui. O Museu da Língua Portuguesa, o Museu
Nacional, o Museu do Ipiranga, a Lei Rouanet – paira sobre o Brasil uma ameaça explicitada
em pronunciamentos mil e uma realidade que ninguém contesta.
O mundo inteiro
sai em socorro de uma igreja, para a qual o mundo inteiro viaja. R$ 35 bilhões
serão gastos na restauração de imagens, peças e outros detalhes artísticos da
bela catedral!
Por fim, uma prova de que não estou tão indiferente,
como supõe meu ex-cunhado. Uma de minhas netas, a mais velha, acaba de entrar numa
faculdade federal em Ouro Preto, na área de restauração de obras de arte. Ela
escolheu o curso muito antes de toda essa tragédia.
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