MORAR EM PORTUGAL, NEM PENSAR
A solidão é prazerosa e nos dá a oportunidade de pensar,
buscar alternativas, sonhar. Porém traz consigo o inconveniente de não ter um interlocutor,
alguém com quem possamos conversar, trocar impressões ou tirar dúvidas. Fiz mestrado
e doutorado nisso. Ligo o rádio e desligo, ligo a TV e desligo. Telefono e não
falo. Se atendem, digo que foi engano
Confesso que nunca recorri à geladeira nessas horas, como
é comum na maioria dos casos. Não por medo de engordar, mas talvez porque minha
fome e minha sede sempre foram subjetivas, depende mais de carência afetiva do
que da falta de qualquer necessidade objetiva.
Às vezes, como todo mundo, desejo o impossível. Admito
ter sonhado até com a mulher do próximo. Mas nunca fui bom em roubar o que é
dos outros. Consolo-me com a ideia de ser cuidadoso e honesto, mesmo diante da
possibilidade de não ser crime uma ação consensual.
Pior é lembrar que não consegui dizer uma só palavra
diante do caixão de meu pai. O mesmo aconteceu quando minha mãe se despedia dos
filhos e dos amigos. Nem chorei. Guardei comigo a dor, não soube como
expressá-la diante de ninguém além de mim mesmo. Confundiram-me com o famoso
personagem euclidiano e disseram: é antes de tudo um forte. Não sabiam, sequer
imaginavam, o filme que passava na minha cabeça. Não, amigos, não sou forte,
não sou doido, não morri ainda.
Essa ideia em moda de voltar à terra de nossos
ancestrais pode ser boa para quem tem certo patrimônio ou renda e não depende
de emprego para sobreviver, como Luana Piovanni, o escritor Aguinaldo Silva e
outros, famosos ou não, que desprezaram a Baía da Guanabara por umas casinhas
medievais.
Quem não gostaria de mudar de ares vez por outra,
provisória ou definitivamente? No meu
caso, antes gostaria de convencer-me de minha própria utilidade. Morar em
Portugal, nem pensar!
Comentários
Postar um comentário