ENTERRANDO DÚVIDAS



Há algum tempo venho tentando descobrir a causa do desinteresse por determinadas coisas. Algumas são óbvias, como a diminuição da libido, normal quando se beira os oitenta. O problema é descobrir porque não acho graça nos inocentes cachorrinhos, na dança desengonçada de idosos tentando ostentar jovialidade, no desabafo de certos artistas e nos humoristas que transformam a sexualidade em piadas infames.
É verdade que na juventude também embarquei naquela de me sentir dono do mundo e até aderi à causa operária, sentindo-me senhor de todas as coisas, arrogante como um líder, quase um sacerdote com a missão de salvar a humanidade. Mas era tão tímido, tão tímido, que acabei sendo confundido com dedo duro só porque ficava taciturno nas baladas. Não externava com muito entusiasmo a possibilidade de vitória dos camaradas. Muito mais tarde, quando fundaram o PT, versão modernosa das intentonas comunistas, já não comungava de tanto entusiasmo.
Na verdade, tudo o que queria na juventude era ver o colo da beata ao lado que segurava o vestido para esconder seu lindo tesouro. Só pensava naquilo. Mais tarde, tinha de conviver com pessoas que falavam em Lenin, Stalin, Marx e Engels, que não entendia, nem entendo bem até hoje, mesmo depois de ler parte da obra de Caio Prado Jr.
Pudera. Como alguém com curso secundário incompleto, à época, poderia navegar por páginas tão complexas? O fato de ter convivido com o autor durante uns 30 dias, percorrendo a ilha de Fidel de ponta a ponta, não me credenciava a deglutir o que os intelectuais da USP dissecavam com dificuldade.
Ainda hoje tento entender a tal regra de três, onde menos vale mais, segundo o samba de Toquinho. Como entender então a barafunda em que se transformou o País após denúncias, delações premiadas e demais quiprocós políticos e jurídicos? Não. Minha cabecinha não foi feita para isso. No máximo, ela aguenta suspirar com o desfile de Gisele Bundchen, com as bailarinas do Bolshoi e com a música de Rachmaninoff.
Lamento finalmente  não tocar violão como meu filho e minha nora e sofro com o destino das famílias vítimas da microcefalia, esse flagelo moderno que atinge algumas famílias. 

Assim, no momento em que o País vibra com a confraternização olímpica e todos brigam por sua paternidade, festejo a maratona de ter chegado ao ponto de duvidar de tudo, inclusive da oportunidade de algum dia esclarecer minhas dúvidas. Vou me cobrir de vergonha, aceitar minha ignorância e enterrar minhas dúvidas. E tentar dormir em paz.

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