PERDA DE TEMPO

Não conheço todas as teorias a respeito da perda de tempo. A Filosofia e demais ciências devem tê-las devidamente catalogadas uma a uma e as discutem nas faculdades que se reproduzem por aí aos montes. A prática e a experiência nos dão uma ideia do assunto, qualificando-nos a elaborar nossa própria lista de coisas que devemos evitar. Cada um tem sua própria regra e segue os ditames de seu pensamento. Já dizia Pirandello que a verdade se constrói como nos apraz. É a verdade de cada um. 
Pelos dissabores, a primeira coisa que evito é pensar em dívidas. Não me refiro apenas às coisas financeiras, que algum dia, de alguma forma, se resolvem sozinhas ou com a ajuda do imponderável. Tampouco às de amor, que se pagam na cama ou em qualquer recanto imposto pela discrição. Refiro-me às dívidas que se contrai com amigos e parentes, algumas impagáveis pelo valor incalculável.
Não conheço ninguém que em consequência de uma topada tenha tido um encontrão com Gisele Bündchen. Por isso, a segunda coisa que tento evitar são os percalços da calçada, vulgarmente conhecidos como topadas. A maioria das cidades, mesmo quando bem cuidadas, são cheias de armadilhas que atingem principalmente pessoas com dificuldades de locomoção. Num sentido mais amplo, driblo as topadas com os vizinhos, os parentes e amigos, os vendedores e cobradores em geral e sobretudo com as mulheres, que ora nos acodem, ora nos sufocam; ora nos deliciam, ora nos agridem, principalmente quando se deparam com algum comportamento inadequado – uma topada sentimental.
Evito um olhar fantasioso sobre a vizinha, a colega de trabalho, a professora de estudos árabes da USP, a atriz da televisão e até sobre a modista Kika Simonsen, cuja foto iluminava outro dia a coluna de Sônia Racy no Estadão.
É pura perda de tempo. Dificilmente elas vão ceder aos encantos de alguém que se anuncia. Mesmo se elas retribuíssem com um sorriso, isso não quer dizer que estariam dispostas a ir para a cama., constituindo no máximo uma leniência (para usar palavra em moda) aos mórbidos desejos do atrevido voyeur.
Não sou contra perder tempo nas filas. Só não é agradável se o indivíduo se armar de preconceito contra os variados tipos de pacientes integrantes.
É também perda de tempo se preocupar com a variedade do vestuário dos novos passageiros nas linhas aéreas domésticas. Viaja-se de bermuda e chinelos. Não se vê mais ninguém de gravata. Os passageiros são chamados de viajantes da Dilma, uma maldade.
Vale a pena, finalmente, perder tempo com Mensalão, Petrolão e outras mazelas da política brasileira, como as reveladas pela Operação Lava Jato.
Ainda que os réus se desvencilhem das acusações por falta de provas ou por meio de artimanhas jurídicas, terá valido a pena revelar a podridão. Não terá sido perda de tempo.


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