A PRESSA E AS FILAS


Durante alguns anos trabalhei na área de comunicações e marketing de um banco, na Praça Patriarca, centro de São Paulo. Na hora do almoço, saíamos em grupo à procura de um restaurante nas proximidades, explorando quase sempre o prato do dia: virado à paulista, às segundas; feijoada, às quartas; filé de peixe com purê de batata, nas sextas... Nos fins de semana a rotina era outra. Ninguém escapava da feijoada, precedida de caipirinha e chope.


Às vezes os companheiros habituais de almoço - Patrício Renato Bentes, Maria Amália Krause, Paulo Mori, Gleise Fortes Santa Clara, Arlene Salvadori, Antônio Gaspar, Albert Strasse, entre outros, cuja memória se perdeu no tempo - eram substituídos por personalidades de alguma forma relacionadas com o jornalzinho interno que editávamos, como o diretor de marketing da instituição, Antônio Fernando De Franceschi, o escritor Osman Lins, que trabalhava no Banco do Brasil, ali na Avenida São João, e certa vez foi entrevistado pela equipe do nosso house organ, ou poderia ser o jornalista Mário de Almeida, que costumava frequentar a sala de Franceschi e esticar o papo pelos bares das proximidades.


Entre a Praça Patriarca e o Vale do Anhangabaú havia generosa escada rolante, que poupava o transeunte de subir ou descer íngremes escadarias. Mas o que se via, ou ainda se vê, são pessoas apressadas que sobem correndo os degraus da escada rolante, querendo ganhar tempo, alguns segundos, em sua desesperada jornada diária. Olhava para o Franceschi e soltava um comentário qualquer. Só nos restava sorrir, quando atropelados pelos candidatos à corrida de S. Silvestre.
Eis que, já aposentado e sem nenhuma pressa, dirijo-me uma vez por semana a uma loteria esportiva. Jogo feito, nada mais que uns vinte reais na Quina e na Megasena, tento entrar na fila e os demais apostadores quase que em coro me avisam, solícitos: “Não, senhor, pode passar na frente, o senhor tem direito”. Inutilmente tento explicar que não é preciso, que não tenho pressa, etc., mas eles insistem e me obrigam a assumir o primeiro lugar na fila.
Na verdade, a fila anda rápido nesses casos, e no fundo não faço a menor questão se alguém iniciar uma conversa qualquer, mesmo óbvia, que nos dê o pulso daquele momento, tipo o tempo está bom ou ruim, o trânsito vai mal e aquela nuvem é sinal de um toró.
Afinal, já li de cabo a rabo o Estadão e a Folha de S. Paulo, já levei os netos na escola, já li o romance de Mário Masetti (“Por amor”) e ouvi o Concerto para violino em Dó Maior de Tchaikovsky na íntegra. E por Sarah Chang.


Assim, uma fila a mais não faz diferença para quem ralou a vida inteira e já não treme diante da espera. Nem teme.

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