EU ME APAULISTEI
Malgrado o neologismo que intitula
este comentário, esta é exatamente a impressão tida por um velho e querido
amigo ao ler as impressões que preenchem meu caderno de memórias apelidado de
blog. Ele acha que de pau-de-arara me transformei em paulistano pretensioso,
orgulhoso, preconceituoso, daqueles que passam a vida inteira sem conhecer o
Rio de Janeiro só porque acha que o Pico do Jaraguá é oitava maravilha do mundo.
Tudo isso ele argumentou porque não me solidarizei de imediato com os franceses
no caso do incêndio da Catedral de Notre Dame.
Na opinião deste amigo - um
brasileiro que se mudou para Paris há meio século - eu deveria, como todo
mundo, beijar as fotos e louvar os franceses por construir e manter tão
valioso patrimônio, visitado e reverenciado por milhões de pessoas do mundo
inteiro. Como é sabido e notório, ali estão relíquias não apenas da França, mas
de várias partes do mundo, todas de valor inestimável, conforme vem sendo
minuciosamente descrito por especialistas e curiosos.
Devo penitenciar-me ou admitir que me
deixei influenciar por tudo o que o paulistano deixa transparecer em sucessivas
manifestações de suposta superioridade?
Talvez sim, talvez não, sobretudo por não me enquadrar em nenhum
protótipo de pau-de-arara. Teria sido de fato um perseguido político, cuja
periculosidade não bastava para incansáveis buscas. Uma vez paulistano, em vez
de construir prédios continuei jornalista. Em vez de me especializar, escrevi sobre
os mais variados assuntos, de Eduardo Araújo a Contabilidade, mas nunca
procurei conhecer a fundo a Notre Dame. Estive na porta da igreja mais de uma
vez, mas nunca entrei. Não havia ainda a mania de selffies.
Com isso quero dizer com toda
franqueza que mesmo tendo pertencido à Associação Paulista de Críticos de Arte
não me sinto à vontade para discorrer sobre as diferentes obras que engrandecem
Notre Dame. Sua apreciação exige conhecimento de diversos ramos de Arte, não
apenas pintura, escultura, desenho ou peças sacras. Temia não conseguir diante
dos vitrôs o mesmo orgasmo que obteria no Moulin Rouge ou diante de Mona Lisa
no Louvre, mesmo que o primeiro estivesse decadente e o segundo já detonado por
várias restaurações.
Assim, minha suposta falta de
solidariedade ao que anda acontecendo com a Notre Dame não se deve à
indiferença, mas ao despreparo intelectual, que também me impede de doar R$ 44
milhões para restauro, como dona Lily Safra. Neste caso, o despreparo é de fundos.
Mesmo assim, embora com algum atraso,
minha solidariedade aos franceses que pretendem reconstruir o valioso monumento
histórico.
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