VISITA A VELHA SENHORA
Sou daqueles que moram em São Paulo
desde 1964 por razões conhecidas e pelo menos uma vez por ano visitam
Pernambuco para rever parentes e amigos, que rareiam com o decorrer dos anos.
Mais uma vez aproveitei a
oportunidade para fazer um tour saudosista, visitando a serra
das Ruças, o atelier de J. Borges, o Cristo de Gravatá, o Instituto Brennand e
demais atrações turísticas. Visitei também o Arquivo Público estadual, para
rever as páginas em que Mauro Mota inseriu poemas de amor de um jovem gravataense
apaixonado.
Como de hábito, visitei velhos
amigos. Convenceram-me a não visitar um velho jornalista com Alzheimer. Liguei
para outro, que alegou estar quase cego e me prometeu visita, que não fez. A
menina que vi nascer está uma linda moça, 18 anos, e mais não digo
para não ser processado por assédio.
Fui visitar uma velha amiga, mesmo
sabendo que ela não me reconheceria, nos seus 100 anos bem vividos. Não avisei
antes, sequer telefonei, para evitar aquela sugestão tipo desista, ela não
conhece nem as próprias filhas, que dirá um amigo que não vê há mais de 50
anos!
Fui. A casa é a mesma, na avenida
Beberibe, 3.122, portão sempre aberto durante o dia. Outrora foi palco de
memoráveis encontros, muitos dos quais tive a honra de participar. Quem
chegasse, subia a rampa íngreme e estacionava o carro bem na entrada da casa.
Era necessário ser bom motorista para realizar tal proeza. Eis aí a primeira
surpresa: a casa continua incólume. O portão continua aberto.
A casa é de Paulo Cavalcanti, que foi
deputado, promotor público, secretário da prefeitura e membro do Partido
Comunista Brasileiro. Seria exagero dizer que a história de Pernambuco passara
por ali, mas com certeza as mais importantes personalidades ali para discutir
os destinos do mundo e da literatura. E não apenas pernambucanas. Paulo
dialogava com Prestes, Ariano Suassuna, Jorge Amado, Arraes, Pelópidas, Hiram
Pereira - no Rio, em Paris, Moscou, onde pudesse defender suas ideias.
Ofélia, sua mulher, esteve presente
em todos esses momentos, com a elegância, discrição, charme e sabedoria que
passou aos filhos e netos, que agora se revezam qual cuidadores da história.
Ao cumprimentá-la, fiquei em dúvida
se ela me reconheceu ao lacrimejar. Aos 82, pedi a minha irmã para dirigir o
carro. Não tinha como segurar a barra, quer dizer, o volante.
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