A TIMIDEZ DE GILVAN LEMOS
Ao cabo de muita meditação durante e após leitura da
biografia de Gilvan Lemos, escrita por Thiago Correa para a Companhia Editora
de Pernambuco (CEPE), alimento dúvidas sobre a validade do sacrifício que ele
se impôs para obter fama como escritor, com morte inglória e solitária ao chão
do apartamento. Teria sido melhor morrer de amor nos braços das “meninas” que
ele frequentava no Recife Antigo, pelo menos quando jovem.
Não. Ele preferiu passar a vida inteira sobre uma Hermes
Baby e depois sobre uma Remington, bolando estórias mirabolantes para deleite
de leitores imaginários que lhe deram notoriedade mas pouca compensação
emocional ou financeira. Ele mesmo confessa que teve de trabalhar anos a fio
numa Repartição Pública, no caso o INSS, onde se consagrou como excelente
burocrata, ao mesmo tempo em que tentava, a duras penas, oferecer seus escritos
a editoras insensíveis e desinteressadas.
Foi preciso que Osman Lins, Mauro Mota e outros escritores
já consagrados o socorressem com referências simpáticas a seus escritos, só
assim conseguiu interessar editoras. Admitamos que isso é normal na vida da
maioria dos escritores. Raramente um escritor começa fazendo sucesso. Pode-se
atribuir as dificuldades de Gilvan Lemos em deslanchar sua carreira de escritor
à sua excessiva timidez, várias vezes mencionada ao longo de sua história. Recusou-se
a concorrer à Academia Pernambucana de Letras, sendo eleito à revelia. Devolveu
retrato feito pelo pintor Romero Figueiredo, sem nenhuma explicação. No fim da
vida, com mais de 80 anos, recusava a companhia de cuidadores por puro orgulho,
até cair inerte, sem chance de pedir socorro.
O que importa é que seus livros ganharam importantes prêmios
literários, ao ponto de serem reeditados, inclusive pela CEPE, que os mantém em catálogo. Sua história
é mais uma das brilhantes e indispensáveis biografias da Coleção Memória, em que
a imprensa oficial homenageia as mais importantes personalidades de Pernambuco.
Orgulho-me de saudar esse lançamento e, mais ainda, de relembrar as tardes que
passamos juntos na livraria Livro 7, em tímidas tertúlias. Derradeira e
inevitável constatação: eu era ainda mais tímido.
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