DESCONHECIMENTO
Pensava que conhecia
um pouco de Literatura, até ler a programação da Festa Literária Internacional
de Paraty 2016, para 29 de junho a 3 de julho. Além de Caco Barcelos, que
conheço mais como repórter do que como escritor, não tenho nenhuma familiaridade
com os ilustres convidados do curador Paulo Werneck. Que me perdoem Svetlana
Aleksiévitch, Prêmio Nobel de Literatura, as 17 mulheres e os 11 homens que
levarão seus livros para a 14ª Flip. Provavelmente tenho desperdiçado meu tempo
com bobagens eletrônicas e nos congestionamentos, daí minha ignorância
ululante.
Pensei que conhecia um
pouco de música popular, só porque ouvia Mônica Salmaso, Elis Regina, Teresa
Cristina, os violonistas Yamandu Costa, Paulo Tiné e Paola Picherzky, entre
outros, bem como por ter visto e ouvido Ensaio”, de Fernando Faro, desde os
primeiros programas ao vivo, direto do campus da USP.
Um dia li “A noite do
meu bem”, de Ruy Castro. Foi uma paulada na minha santa ignorância. Muito antes
acompanhara toda a trajetória melódica que se desenhava a partir da cozinha de minha
mãe, que cantava de Ângela Maria a Nelson Gonçalves. Eu mesmo “acompanhava” ao
violão Romero de Figueiredo, em noites de lua – memoráveis serestas. Quando
surgiu na televisão um quadro em que o cantor deveria cantar algo em torno do
mote “a palavra é...”, percebi que realmente nada sabia de MPB. Quem sabia, na
época, era Caetano Veloso, Chico Buarque... Acabei aprendendo muito com o
programa “Memória”, da rádio Bandeirantes AM, que dispõe de um dos mais completos
arquivos de MPB do País. Até ouvir a rádio Globo AM nas madrugadas. Alguém pede
uma música, qualquer música, o próprio apresentador faz uma busca e em alguns
segundos a coloca no ar, mesmo que seja estrangeira. Nunca vi tanta rapidez e
competência!
Em matéria de
política, então, eu me achava quase um gênio. Sabia até quem fora Dr. Paulo
Pessoa Guerra, que dera o nome à rua em que morava minha ex-sogra em Jataúba
(PE). Fora senador e governador do Estado de Pernambuco. Até conheci
pessoalmente Miguel Arraes de Alencar, Pelópidas Silveira, Paulo Cavalcanti,
Gregório Bezerra, Hiram de Lima Pereira, Francisco Julião, João Lyra Filho,
Fernando Lyra, João Lyra Neto. Pensava que sabia de tudo, até migrar para a
imensa São Paulo e beber na fonte de Caio Prado Júnior, ao mesmo tempo em que
circulava por todos os meandros da Editora Abril, Estadão, A Gazeta, Diário do
Grande ABC... Não. Definitivamente, não sabia nada.
Um dia entrei no
Hospital das Clínicas da FMUSP. Arregalei os olhos, coloquei suspensórios, usei
óculos de grau, até me humilhei na tentativa de entender o máximo, para atingir
o mínimo, durante 21 anos. Recentemente, voltei lá para fazer uma tomografia e
tirar uma dúvida a respeito de eventuais esquecimentos. O médico sentenciou:
você não tem nada na cabeça. E eu ainda tentei, num gesto tímido: literalmente?
Ele me consolou com um sorriso. Ainda bem. Tudo é apenas uma questão de
desconhecimento. Imaginem minha dificuldade para digerir o momento atual. Está difícil.
10/05/2016.
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